31 março 2006

A madrasta verdade no dia das mentiras

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Mas isto pode ser do meu ouvido, que é 1 pouco mouco.

30 março 2006

Get your kicks on Route 66!

The Legendary Tiger Man

The Legendary Tiger Man
Lux, Lisboa
29 de Março

Hoje, naquele período que mistura a manhã com a tarde, por razões insondáveis a SIC exibia, como dizem que faz diariamente, os comentários de três pessoas à vida privada de uma ou outra criatura cujas existências, conhecidas pelo seu absoluto vazio fora do universo do mundano, parecem ser interessantes para uma não desprezível quantidade de pessoas também sedentas de substracto que as preencha. Embaraçosamente provinciano e constrangedor, o espaço televisivo, em que se discutia com preocupante seriedade se uma tal criatura Jardim estaria ou não de amores com um tal espanhol com actividade médica, fez o signatário pensar num pedaço da noite anterior.

Foi o próprio quem me confirmou, algum tempo depois de apresentar o seu novo álbum (já lá iremos), que em Setembro se casará. Felizmente, o assunto nunca será objecto de discussão na citada confrafria de inúteis, uma vez que, além de não constituir fenómeno de relevância social absolutamente vital (como o tal caso Jardim), é acompanhado pela obsessão da criação artística. É isso, precisamente, que fascina. Quando, entre Setembro e Outubro de 2006, Paulo e Isabel andarem pela Route 66 a fazer os Estados Unidos de costa a costa em lua-de-mel, terão consigo uma câmera Super 8 que de acordo com os planos servirá para registar não apenas a convivência conjugal, mas a convivência com referências e civilizações que marcam aquele que é um dos maiores músicos portugueses realmente vivos. E, pelo que se conhece ao elemento masculino da relação, a coisa não servirá apenas para mostrar à eventual descendência em tardes de domingo, esperando-se mais um acto superior de apropriação e partilha de ideários e imaginários a que o português comum tem culturalmente dificuldade em aceder. Perdoai-me os leitores da Grazia, mas são estas genuínas demonstrações de procura criativa que me estimulam.

Paulo Furtado, que fique claro, é um belíssimo amigo, daqueles que pessoalmente se preocupa em indagar a morada para onde enviar um convite para o serão em que pela primeira vez mostra o seu novo disco, Masquerade, ao vivo. Conscientemente afastado do estanque "meio musical" que em Lisboa actualmente gravita, não conseguiria o improvisado repórter recusar um convite efectuado com respeito, amizade e, pode dizer-se, uma cumplicidade construída em anos de interacção. E ali estava eu, cinco minutos depois de começar o espectáculo, no Lux, onde há meses não colocava os membros inferiores por manifesta ponderação de prioridades e crescente repulsa pela complexidade intangível do binómio ver/ser visto. No palco não estava, na ocasião, Paulo Furtado, mas essa trepidante entidade que responde pelo nome de Legendary Tiger Man. Do lado de cá, não está apenas o amigo, mas o adepto, o associado, o "torcedor". Gozando plenamente da vantagem de não ter trabalho a cumprir no serão.

The Legendary Tiger Man, então. Não tem muito que saber: é um dos poucos projectos portugueses com alma própria, tão própria como construída a partir de umas quantas almas grandiosas que marcam a História norte-americana sobretudo no tomo dedicado aos blues. Por essa razão, principalmente por essa razão, Paulo Furtado já me ouviu mais do que uma vez afirmar sem hesitação que Portugal é, por razões culturais e outras como ginásios e programas televisivos matutinos, absolutamente incapaz de absorver e viabilizar (precisamente: pagar) qualquer coisa como a música do Lendário Homem Tigre. Nessa mesma noite, diziam-me que deviam ter estado recentemente em Coimbra todos os portugueses que apreciam os blues e que, acrescento eu, reconhecem vida para lá de BB King. Imagine-se, portanto, se não é fora deste quintal que as possibilidades de compreender uma tradição sulista norte-americana se materializam. "One man show" é coisa de circo, parece-me ouvir sempre que penso nisto.

É daí, dessa tradição e da repetida audição dos mais destemidos, enigmáticos ou praticamente invisíveis praticantes dessa combinação dos blues com o rock'n'roll que vem este engenho criativo de Paulo Furtado na versão The Legendary Tiger Man (descontando, propositadamente, nesta ocasião experiências como os Tédio Boys e os Wray Gunn). Quando chama ao palco o magnífico Dead Combo (para a interpretação de "Let Me Give It To You") e João Doce e Nelassassin (para, respectivamente, acrescentarem percussão/coro e turntablism a "Say Hey Hey"), Paulo Furtado não se transfigura numa balofa criatura de desmesurada ambição. O que ali importa é, na realidade, perpassar subtilmente a sua música com universos que a ele se adaptam e não o assustam nem se agigantam esfaimados. Ainda que, com toda a naturalidade, o maior manipulador de gira-discos em Portugal (Nelassassin) chame a si especial atenção pelo (aparentemente) inusitado diálogo do vinil com a guitarra e a voz. Nada de mais, apenas a combinação do trabalho de dois eleitos.

The Legendary Tiger Man passa por todo o novo Masquerade, o principal pretexto que ali o levou, mas regressou igualmente a Naked Blues, que o mostrou ao mundo que não dorme. Mas para Paulo Furtado um triunfo anunciado não é suficiente, servindo ainda o Lux para dar vazão ao trabalho em vídeo que ele próprio e gente como André Cepeda ou Edgar Pêra oferecem a canções que vão do eternamente atraente imaginário "middle of the road" às sinuosas histórias de amor e desamor sob néon onde se lê "Motel". Os cumprimentos ao músico, depois de cumprida a tarefa, referem-se precisamente a um composto de música e imagem que transportam diletantemente o consumidor para essas terras de ninguém que só os velhos discos e as essenciais leituras tornam acessíveis.

Mesmo que o facto já não cause estranheza, inevitável se torna dizer que, sempre que Paulo Furtado (na encarnação The Legendary Tiger Man) dá aparentes passos atrás no tempo está a quebrar recordes de salto em comprimento no espaço baptizado Portugal. Para Este (que o diga a revista francesa Rock & Folk) como para Oeste, tornando-se o Atlântico num fio de água que tão facilmente se transpõe com uma voz de poeira no ar, uma guitarra que tanto fere como acaricia, um bombo e um prato-de-choque que parecem tocar sozinhos. Bem sei que este pode ser tempo e espaço perdidos na elocubração mental em torno de qualquer coisa que não existe na vizinhança de nenhum de nós. Mas, fuck it!, alguém tem que dizer sem compromissos de espécie alguma o quão distante deve agora chegar o novel Masquerade. Geograficamente falando, sobretudo.

Mas isto pode ser do meu ouvido, que é 1 pouco mouco.

28 março 2006

Benfica 0 - 0 Barcelona

Benfica-Barcelona

Obrigado Benfica, por dar o que tinha e o que não tinha.

Obrigado Catedral, mais uma vez.

Obrigado "mr. referee", por ter cirurgicamente cumprido as proverbiais expectativas da UEFA face às equipas que dão jeito ir longe na Liga dos Campeões.

(De caminho, obrigado Fabregas e Henry, por porem os gunners onde têm que estar).

Mas isto pode ser do meu ouvido, que é 1 pouco mouco.

26 março 2006

SLANG

SLANG

Eu, no lugar do estimado leitor, estaria atento às bancas vendedoras de publicações periódicas ao longo dos próximos dias. A justificação é a chegada ao mercado da arrojada revista SLANG, coisa nunca vista no quintal chamado Portugal. Música, desporto, cultura urbana e masculina em geral são as ténues fronteiras que balizam o projecto, com forma e conteúdo nos antípodas do amadorismo cauteloso que marca muita da produção dita para "gente jovem".

De uma inédita reportagem sobre Beat Diggin' em Portugal a uma foto-reportagem do dubstep no Reino Unido, das histórias e imagens dos Story Tailors à irresistível sobranceria de um street skater preso na Tugalândia, a SLANG é um mimo para olhos e cerebelo. Com a aventureira sapiência visual de Paulo Arraiano e Luís "Roca" (este do projecto Conspira), não é coisa de estranhar. É de entranhar.

Mas isto pode ser do meu ouvido, que é 1 pouco mouco.

22 março 2006

Ramos Radio Voz Voxx

Num daqueles dias em que a actualidade passa como uma brisa que nem toca o corpo, é a noite que amiúde traz o contacto com a realidade que se constrói fora dos nossos casulos. Foi exactamente isso que se passou ontem, quando um dia vagamente animado foi lacerado pela notícia da morte de José Ramos, que muitos conheciam como a voz off da SIC.

No caso, importa-me pouco o que fazia José Ramos. O que sei é que tinha uma voz que invejava, uma voz que provoca natural inveja em quem, como o signatário destas linhas, sonha acordado com a rádio mas não faz grande esforço por encaixar-se no caciquismo em que hoje funciona o excrementício meio de comunicação.

Já que é de rádio que falo, há algum tempo que ando para partilhar uma opinião sobre a estação que mais oiço, a TSF. Reconhecida pelo criterioso conteúdo noticioso/jornalístico, a TSF foi em tempos por mim também reconhecida como um exemplo em matéria musical. Sem, necessariamente, dar de frente com os meus gostos, percebia-se ainda assim o mesmo princípio criterioso de difusão musical. Nesse capítulo, a TSF é hoje uma patética extensão do vergonhoso espaço nocturno por muitos baptizado como A Idade da Incontinência. É uma pastosa nulidade sonora que funciona 24 horas por dia e que faz pensar no que terá acontecido ao saber outrora aproveitado de gente como Mário Dias e Aníbal Cabrita. Actualmente, quando a TSF passa música o escriba desliga o transistor.

De regresso à prematura morte de José Ramos, traído pela mesma garganta que me encantava, recusarei a hipocrisia de dizer que perdi um amigo, como é frequente afirmar nestas ocasiões. Nem sequer conhecia José Ramos. Queria, isso sim, ter aquela voz. O que aqui me traz é o facto de conhecer e nutrir especial carinho por Pedro Ramos, filho de José Ramos e ele próprio profissional de rádio. Hoje na Radar, foi meu camarada na finada Voxx. Foi na Voxx que lhe reconheci, além do gosto e da cultura musical, um humor estranhamente espontâneo e cirúrgico, tão natural como científico. Foi na Voxx que comecei a gostar muito do Pedro.

No fundo, foi o Pedro que me fez vir aqui escrever estas linhas. Não tanto por admirá-lo, mas por gostar muito dele. Do tal humor mas também da sua evidente sensibilidade. No fundo, apenas servem estas linhas para tentar fortalecer uma bomba energética que desejo que se abata sobre o Pedro Ramos nesta altura. O Pedro merece, profissionalmente, ver-se um dia reconhecido como o pai. Mas nesta ocasião o que mais merece é saber que existe quem, à brasileira, esteja com ele e não abra. É o meu caso.

E isto não é do meu ouvido, mesmo sendo 1 pouco mouco.

21 março 2006

Quiz

James Blunt

Não posso iniciar esta prosa sem pedir sinceras desculpas pela imagem que suporta este post. Aceite o perdão, serve o presente para dar conta de uma noite perfeitamente aziaga para o majestoso combo que dá pelo nome de TV Rural e que semanalmente se reúne nas noites de segunda-feira no Quiz do Espaço Portela. Reportando-me directamente aos factos, direi que foi um patético sexto lugar, mais patético ainda quando se sabe que mais três respostas certas chegariam para a vitória e que, no último instante de correcção, três das nossas respostas foram alteradas. Apenas do certo para o errado. Nesta coisa dos blogs, em que serei sempre novato, não sei que linguajar utilize, mas um sonante "foda-se!" parece-me lindamente nesta altura. Assim como quem não quer a coisa, e a título de exemplo, por que carga de água não soube o lendário TV Rural responder acertadamente a perguntas como a que pedia o nome do Presidente francês falecido em 1974, o nome do núcleo antigo das cidades árabes do Norte de África ou a porra da autoria arquitectónica do Empire State Building? Sabe-se lá. No campo puramente musical, graças aos inenarráveis Sixpence None the Richer não foi feito o pleno. A categoria incluia ainda questões sobre os Blind Zero, os (inenarráveis também) Fingertips e o genérico da lendária série televisiva Verão Azul. No momento já estou mais apaziguado, ao som dos duetos de Johnny Cash com June Carter (está o gentil leitor a ver Walk the Line, o filme? Não tem nada a ver). Mas com azia.

Mas isto pode ser do meu ouvido, que é 1 pouco mouco.

18 março 2006

Lura tal qual Gladys Knight

Lura

A comparação é de Tom Smucker, que no Village Voice compreensivelmente se derrete com a música da cabo-verdiana adoptada por Lisboa. Lura, de seu nome.

Mas isto pode ser do meu ouvido, que é 1 pouco mouco.

17 março 2006

O estar quase...

Morrissey

A besta que vendeu a ideia de que um blog é uma espécie de diário informatizado é, precisamente, uma besta. Um diário, compêndio de escritos onanistas com interesse habitualmente reduzido para a população mundial, é coisa de gaja. Não é bom nem mau, é apenas coisa de gaja e não carece de actualização, sendo a dita perfeitamente dispensável quando trata de flirts e beijinhos.

Isto a propósito da dificuldade recorrente de actualização dos blogs em geral e deste em particular. Um blog quer-se vivo, daí a instalação da angústia quando a disponibilidade física e/ou mental não permite que se juntem palavras com nexo para partilhar com quem tem a condescendência de lê-las. Ora este espaço, que numa primeira análise se dedica à música e às miudezas circundantes, provoca no seu criador amiúde essa angústia.

No momento presente, por exemplo, bem gostava que factores interiores e outros cósmicos permitissem a dissecação escrita de discos assinados por gente como Andrew Bird, Arctic Monkeys, Bell Orchestre, Belle and Sebastian, Ben Harper, Beth Orton, Broadcast, Cat Power, Destroyer, DJ Shadow, Giant Panda, Heavy Trash, His Name is Alive (sim, é verdade...), Hot Chip, J Dilla, Jahcoozi, Jens Lekman, Kero One, Kiprich, Liars, Lindstrom & Prins Thomas, Maximo Park, Mogwai, Mudhoney (sim, é verdade...), Neko Case, Nightmares On Wax, Prefuse 73, Prince, Ray Davies (sim, é verdade...), Richard Ashcroft, Saint Etienne, Skalpel, Stereolab, Sway, Tiga ou Yeah Yeah Yeahs. É uma maçada, esta incapacidade de traduzir tudo o que se ouve em palavras. Pelo menos num tempo unanimemente considerado útil, quando as prosas parecem fazer temporalmente sentido.

Nem tudo são más notícias, no entanto. Concentra-se o signatário, nesta altura, na absorção compulsiva de Ringleader of the Tormentors, o novo álbum de Morrissey com edição agendada para 4 de Abril. Este, como se imagina a partir da leitura de posts anteriores, é um disco que passa à frente de todos os outros e que merecerá, muito em breve, tradução faixa-a-faixa neste seu humilde espaço. Para já, foi impossível contrariar a vontade de partilhar que o disco não é, nem de perto nem de longe, uma consequência (ou sequer uma sequência) de You Are the Quarry, que a produção de Tony Visconti é uma preciosidade que transporta o génio para universos díspares e que, afinal, felizmente Ennio Morricone não aplicou aqui os trâmites que partilhou com Dulce Pontes.

Às tantas esta é uma recriação de Morrissey, é qualquer coisa que cheira à sua estreia a solo, Viva Hate, disco vetusto mas de sempiterna grandiloquência. Não na forma nem no conteúdo, mas na intenção, na carga frequentemente épica, na desfaçatez com que o autor lida com a ditadura da moda. Ou muito me engano ou estou satisfeito.

Mas isto pode ser do meu ouvido, que é 1 pouco mouco.

14 março 2006

Quiz

Youssou N'Dour

Para mais fácil compreensão deste post, sugere-se a leitura do post anterior dedicado ao Quiz semanal do Espaço Portela, em que falava da agrura da travessia do deserto. Ao que parece, foi a dita interrompida na vida do mítico combo intelectual que responde pelo nome de TV Rural e do qual faço orgulhosamente parte. Numa palavra, ganhámos. Ganhámos a sessão desta segunda-feira. Por uma resposta de diferença, sendo que a dita pode ser atribuída ao facto de nos termos aproximado milimetricamente do valor da temperatura mais baixa alguma vez atingida num ponto do globo terrestre. 89,2 graus centígrados negativos, diz o livro dos records, 91 graus negativos respondemos nós. O nosso precioso rookie sugeria um valor mais temperado, no que foi contrariado, mas a certeza com que aventou outras respostas fez toda a diferença na sessão em causa. Teria a distância face ao segundo classificado sido maior caso, na ocasião, entre diversas outras coisas tivesse ocorrido ao distintíssimo colectivo que o Tratado de Roma instituiu o Banco Europeu de Investimento, que o significado de HTML não é nada do que supúnhamos e qual o nome do realizador da telenovela "Gabriela". Em matéria puramente musical, o serão não foi de plenitude acertiva, facto que, ainda assim, não envergonha dadas as personalidades envolvidas. Huey Lewis & The News e Youssou N'Dour com Neneh Cherry foram, como soi dizer-se, como limpar o rabo a meninos. Em contapartida, saíram completamente erradas a resposta relativa aos inenarráveis O-Zone e a que questionava a origem geográfica de Freddie Mercury. No que a mim me diz respeito, numa altura em que uma certa revolta quase me impele a abrir guerra com metade da população mundial ao som de Jon Spencer e Matt Verta-Ray (procurar o álbum Heavy Trash, do projecto com o mesmo nome), esta vitória não deixa de dar alento para mandar com propriedade renovada uma ou outra pessoa para a meretriz que a deitou ao mundo.

Mas isto pode ser do meu ouvido, que é 1 pouco mouco.

10 março 2006

Que falta fazia...

Festival da Canção

Uma das minhas primeiras memórias musicais pré-Smiths é a de estar em casa dos meus pais com todo o agregado a fazer a votação nos festivais da canção, tanto portugueses como os da Eurovisão. Coisa séria e compenetrada, o que é que julgais? Coisa boa para desenvolver o espírito crítico, perceber o que é uma canção ou o que não deve ser uma canção. Naturalmente, não desenvolvi nem percebi nada disso nessa época. Era um serão animado que o tempo tratou de tornar repelente.

Começou há pouco mais uma edição do festival português da canção, com transmissão em directo na RTP. Instalado com uma tigela de cereais e a ideia de ver um qualquer filme em DVD, a verdade é que parei por ali. Para confirmar, sobretudo, as fortes suspeitas que já nutria: que hoje este evento é absolutamente patético e parolo, a que acresce uma absoluta inutilidade. A música popular, em 2006, não tem nada que ver com isto. Não tem nada que ver com rostos vagamente jovens entoando melodias medíocres que, este ano, suprema novidade, vê as letras repartidas entre o português e o inglês.

Se o simples facto citado anteriormente, o das letra bilingues, era já mais do que ponto assente há décadas nos países realmente apostados em vencer na Eurovisão, aquilo que por ali está a soar no televisor aproxima-se por muito mais razões de uma qualquer cerimónia que esperaria encontrar numa madrugada da RTP Memória. É uma coisa serôdia, bimba, que rejubila pela enésima vez em torno de canções de José Cid e Carlos Paião, mais uns petiscos sem resquício de graça em jeito de musical à portuguesa. Serviço público, dizem.

Há muito que, sem acompanhar estes tormentos televisivos, desejo que Portugal nunca participe no Festival Eurovisão da Canção. Desejo sempre um último lugar, ou lá muito perto, para que não restem dúvidas sobre o não-apuramento para a edição seguinte. Participar naquilo é o mesmo que assumir um imenso orgulho em ser uma cagada, um país rafeiro que dá a pata e abana a cauda para poder ser visto seja lá onde for. ("Portugal é um fado que a História cantou...", acabo de ouvir num refrão que, mais à frente, reza: "Portugal is the music that History sang...") Mas este ano, parece, estaremos em Atenas representados por quem hoje ganhar esta coisa. Paciência. Temos sempre o Mourinho.

Mas isto pode ser do meu ouvido, que é 1 pouco mouco.

08 março 2006

Liverpool 0 - 2 Benfica

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Obrigado Simão.

Obrigado Miccoli.

Obrigado ao grande João Gonçalves e a todos os que lá estiveram a representar-nos em frente ao local onde em tempos ficava a mais mítica bancada da Europa - The Kop.

07 março 2006

Quiz

Underwolrd

A travessia do deserto é uma coisa muito desagradável. É o que está a acontecer ao temível colectivo TV Rural, depois de uma série de três vitórias consecutivas no Quiz semanal do Espaço Portela. Esta segunda-feira, desfalcada do rookie sempre importante quando se fala de geo-política, saiu em sorte o quinto lugar. Teria sido interessante, por exemplo, saber que o barómetro foi inventado por Evangelista Torricelli em 1643, que Jamanta é o nome dado pelos pescadores a uma raia grande ou que rotor é o nome da grande hélice de eixo vertical dos helicópteros. Em matéria de música, foi um semi-pleno. Faltou lembrar o título Hustle & Flow, filme por que a canção "It's Hard Out Here for a Pimp" arrecadou este domingo um Oscar. De resto, foi só chegar aos Deep Blue Something, Transvision Vamp e Underworld. Isto não anda fácil.

Mas isto pode ser do meu ouvido, que é 1 pouco mouco.

06 março 2006

Johnny Marr recorda The Queen is Dead

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No ano em que passam duas dezenas deles sobre a edição desse monumento pop denominado The Queen is Dead, editado pelos recorrentes (para mim, naturalmente) Smiths, Johnny Marr escreve no Belfast Telegraph sobre esse milagre musical. Johnny Marr era guitarrista e compositor dos Smiths, que tinham em Morrissey o génio mais visível. Obrigado ao meu estimado Pedro Dias da Silva pelo envio da prosa, que aqui se transcreve.

The Smiths: Johnny Marr looks back

The Smiths' most celebrated album, The Queen Is Dead, was recorded 20 years ago. Here, their celebrated guitarist reflects
27 February 2006

When Morrissey and I started The Smiths, we thought pop music was the most important thing in the world. It was almost a spiritual thing for us, and because of that, we knew what it meant to be a fan. Our relationship was very emotional, complex and deep. We were with each other constantly for five years.

The Queen Is Dead was our third album and we knew it had to be special. Our trajectory and gone up from day one, but although we were enjoying massive critical and commercial success, it had reached a plateau. I was thinking that if we wanted to be in the same league as The Who or The Beatles or The Rolling Stones, we had to do it now.

I remember preparing songs before we went down to Surrey for a stretch at a recording studio called Jacobs. I was ready to submerge myself completely - it was periscope down. The logistics of recording the record were quite fragmented. We'd already nailed a couple of songs at RAK in London, and we were also doing some concerts, one of which was in the Shetland Islands.

We knew we had our best songs yet, but our way of writing had been the same as ever. "There Is A Light That Never Goes Out", "Frankly, Mr Shankly" and "I Know It's Over" were done in one evening. "Cemetery Gates" I might have got the music for the night before. I'd work on chord changes, and then Morrissey would come round to my place in Cheshire. We'd sit face to face about two feet away. I'd have an acoustic guitar and I'd be holding a recording Walkman between my knees to get a rough arrangement down. We wouldn't breathe out until I'd pressed the stop button.

Other times, I'd drop off a cassette of some music at Morrissey's house. He lived about two miles away, and I'd ride round there on my Yamaha DT 175 and post them through his letterbox. "Some Girls Are Bigger Than Others" was done that way. All the music for that came in one wave while I was watching telly with the sound down.

Jacobs was a residential studio near Farnham. That sounds a bit decadent, but contrary to most albums that were made in the Eighties, ours were done quite cheaply. Firstly, we were on Rough Trade records, and secondly we were quick. Some bands would spend a week on one song, but it was unusual for us not to get two songs down in a day. The Smiths were super efficient, pragmatic and inspired.

Andy [Rourke, bassist] and Mike [Joyce, drummer] had rooms in the main building. Our engineer Stephen Street was in there, too, and Morrissey had the big corner room with the Jacuzzi. I'm joking about the Jacuzzi, but he definitely had the best room, partly because we liked making him feel good. We all loved each other, and Morrissey spent more time alone than the rest of us. There was also a separate building, a kind of producer's cottage. I slept there, mainly because I was making noise during the night working on what was going to be happening the next day.

The album's title track was partly inspired by The MC5 and The Velvet Underground. A Velvets outtakes album called V.U. had just come out, and I loved "I Can't Stand It", mostly because it had this swinging R&B guitar. I'd wanted to do something bombastic like that for a while, and "The Queen Is Dead" was the right place to drop it. There's an eight-minute version of the song out there, but it sounds like we've run the marathon then done two laps of honour. Stephen Street's edit for the album was a good decision.

Using [the actress] Dame Cicely Courtneidge's voice at the top of that track was Morrissey's idea, but it was also very apt for The Smiths collectively. We were all fans of classic British films like The L-Shaped Room, A Taste Of Honey and Hobson's Choice. The aesthetic of those movies was a huge source of inspiration, feeding into our music and artwork. Morrissey's never really been given full credit for that.

We got clearance to use Cicely's voice pretty easily, but we were less lucky with our original idea for the album's front cover. We'd wanted to use a still of Harvey Keitel from Who's That Knocking At My Door, but he knocked us back. We also asked Linda McCartney to come and play piano on "Frankly, Mr Shankly", but she couldn't make it, bless her.

People sometimes ask me who Anne Coates [credited with backing vocals on "Big Mouth Strikes Again"] is, but it's actually a name I made up. The high, synthetic-sounding backing vocal on that song was down to a bit of kit called an AMS Harmoniser. Another talking point is the lyric for "Frankly, Mr Shankly." At the time Morrissey didn't say anything about it being a dig at [Rough Trade boss] Geoff Travis and his bad poetry, but even if he had done, I wouldn't have cared. As I recall, a couple of people at the label said, "Tut! Tut! Somebody's not very pleased with you boys." There was no real indication of what was to come, though.

It was very upsetting when Rough Trade injuncted the album. Given its title, we were expecting flak from the tabloids, but the Rough Trade thing caught us off-guard. We'd made this great record that we'd thrown our hearts into, and we didn't know when the public would get to hear it. It was time for me to up periscope again, but I couldn't really do that until the record came out. I felt that we were stuck in purgatory, and it added to the mounting sense of heaviness that was surrounding us at that point. You can hear it on songs like "Never Had No One Ever."

Andy's problems with heroin were another worry, but we were all very supportive on a personal level. It wasn't doing him any good to carry on being the way he was. There was no problem with his playing on the album; it was more the live shows and the worry that something was going to go cataclysmically wrong for him personally, which in fact it did. When he did get busted and we had to sack him for a while...well it was probably a blessing, really. Much, much worse could have happened.

With the album still injuncted, I decided to go and kidnap the master tapes. It felt very noble, felt like I was doing my band mates and the fans a big favour. My guitar tech, Phil Powell, and myself drove all night in two feet of snow and got to Jacobs just before daylight. With the dawn came the realisation of how stupid our mission was. The people at the studio - it wasn't their fault that they hadn't been paid by the label. They told us they didn't have the authority to release the masters, and we drove off again a bit sheepishly.

Things were finally resolved, and in May 1986, we released "Bigmouth Strikes Again" as a single. We were ecstatic. By this point we didn't care what people thought of it - it was just a huge sense of relief to have something coming out. I'd played a couple of gigs with Billy Bragg on the Red Wedge tour, and in my memory, the release of The Queen Is Dead is tied in with that event. The politics of the tour was one thing, but I felt I'd been treated like shit by the other bands. My wife, Angie, drove The Smiths up to Newcastle and we gatecrashed the next Red Wedge concert. We had no equipment with us, so we hijacked The Style Council's gear and got on stage unannounced. We played the best 20 minutes of our lives. I was so proud. It was partly a sense of vindication and partly just "Great! We're back."

About two months after that, we were booked to do Wogan on BBC1 and Morrissey didn't turn up. Having driven a couple of hundred miles to get there, the rest of us weren't too happy about being left out of the loop, as it were. I didn't care so much when it was some naff show in Italy, us following some guy with a parrot, but this time we felt disrespected and embarrassed. It wasn't like it had been my idea to do Wogan in the first place.

We still had another great album to come, but in the long run not being able to find the right manager was a big factor in the band's demise. Extraneous stuff took over, and I'd defy anyone to try and be all the things that I was expected to be. Just to try and write and perform that music was enough. But in the early days I'd been the one who'd booked the van or tried to blag studio time, and those jobs fell back to me when we were without a manager. It was an insane extension of my original role, and me trying to do all that on the back of a No 2 album was ridiculous.

When I crashed my BMW and managed to walk away pretty much unscathed, it was a turning point. I'd been living the life, and when people see photos of the car wreck, they can't believe I got away with it. It was like a fog had lifted. I stopped drinking a bottle of Tequila before grabbing my car keys. It was time to wise-up and get a haircut.

For a long time, The Queen Is Dead wasn't my favourite record, but I think it stands up very well. We meant every note of it, and it was never a chore. It's audibly a product of its time, but it didn't kow-tow to the fashions or trends of the day. Stephen Street [engineer] deserves a lot of credit. He was the same age as us and we recognised him as a kindred spirit. He had his own quite serious agenda, and there was mutual respect.

The legacy of The Smiths still has a huge impact on my life, and that's fine. When Morrissey and I got together in 1982, it felt like it was going to be significant, but I didn't expect to be talking about The Queen Is Dead two decades later. I last spoke to Morrissey 18 months ago, just about business stuff. Whether we'll ever be on friendly terms again is hard to say, but it's nice to be nice, isn't it?

Mas isto pode ser do meu ouvido, que é 1 pouco mouco.

E o resto...

Festa Mondo Bizarre #25

Mas isto pode ser do meu ouvido, que é 1 pouco mouco.

05 março 2006

1 Pouco Mouco@Mondo Bizarre #25

Mondo Bizarre #25

Está a chegar às bancas a edição #25 da zine de luxo Mondo Bizarre (pormenores sobre a festa de lançamento no post acima) e foi esta a contribuição d'1 Pouco Mouco para a dita.

Mas isto pode ser do meu ouvido, que é 1 pouco mouco.

ENTREVISTA

Jel

NOVO JEL SUAVE COM GARANTIA ANTICON

Jeffrey Logan é, muito provavelmente, um nome como outro qualquer. O mesmo já não se passará com Jel, os seus Themselves ou a Anticon, de que é orgulhosamente membro. Em discurso directo, Jel fala disto tudo tendo como mote “Soft Money”, o seu segundo álbum com essa assinatura.

Um dos problemas inerentes ao diálogo ou ao consumo da música de alguém com estreitas ligações à cada vez mais propalada Anticon, editora norte-americana responsável por publicar discos como dos Why?, Themselves, Nosdam, Alias, Sole ou 13+God (colaboração entre os Themselves e os alemães Notwist), é precisamente o peso que a marca pode ter no processo, sobrepondo-se em forma ao conteúdo daquilo que edita. Jel, ou Jeffrey Logan, um dos decanos da Anticon e elemento dos Themselves, ajuda nesta entrevista a colocar cada coisa em seu lugar. Mesmo que os ditos possam soar vagamente baralhados, bem feitas as contas.
“Soft Money” é o segundo álbum de Jel, editado três anos depois de “10 Seconds”. E é um disco que, como se imagina, contém participações de parceiros de editora, não deixando a hegemonia estética de estar concentrada no seu mentor. Jel não se assusta se se lhe chamar um disco de hip hop inteligente, como não se assusta se na sua biografia lhe chamarem o arquitecto do som Anticon. Ao mesmo tempo que garante que está na sua agenda tanto o trabalho com Mike Patton para os Peeping Tom, assegura também novas aventuras do “casal” 13+God, que junta os Themselves aos aventureiros alemães Notwist. “Soft Money” é uma bizarria no universo do hip hop como ele é hoje genericamente conhecido: é elegante, ambicioso, questiona-se despretensiosamente acerca do mundo supérfluo da ostentação e flui elegante entre convidados que dão tons subtis mas coloridos à criação iniciada na vintage caixa rítmica SP-1200, da Emu.


As primeiras palavras “ao vivo” que podem ouvir-se no seu álbum “Soft Money” são “don’t buy this product, you don’t need it” e todo o tema parece deselvolver-se à volta do consumo de coisas supérfluas. Chamaria a isto um “statement”, quando quase todo o hip hop de hoje lida com “bling bling” e ostentação?
É, decididamente, um”statement” dirigido a toda essa parte do filme da indústria discográfica. Pessoas por quem não me interesso. Tenha que ver com dinheiro ou com a venda de automóveis. Isso não tem nada que ver comigo. Há, neste momento, uma quantidade crescente de produtores que licenciam a sua música para publicidade a automóveis, daí ter pensado ser engraçado fazer um tema cujo som fosse como que o de um anti-anúncio de automóveis.

Uma das questões que se destacam quando se fala de si é o seu velho amor pela máquina de ritmos SP-1200, algo que hoje praticamente nenhum produtor utiliza. Continua apaixonado pelo seu som como quando começou a utilizá-la? O que lhe dá ela que não possa ser dado por um qualquer tipo de software?
Sim, continuo a usar muito a SP-1200 no meu trabalho. A maioria das minhas batidas são feitas através dela e depois transferidas para a MPC (o mítico Midi Production Center da Akai, utilizado por numerosos produtores de hip hop). É uma máquina de rítmos realmente física, não está dentro de um computador. Além disso é aquele som… um som de 12-bit com uma resolução bastante baixa. Consegue produzir alguma distorção que outras máquinas de ritmos não conseguem.

A última vez em que, de modo genérico, as pessoas tomaram contacto com o seu trabalho foi através da edição do álbum assinado 13+God, resultado de uma colaboração entre os Themselves (projecto de que Jel faz parte) e os Notwist (alemães amantes do rock experimental). Que efeito teve essa colaboração sobre si, já que não é todos os dias que as pessoas se cruzam com trabalhos conjuntos como esse? Como descreveria essa experiência?
Teve um grande impacto em mim, desde logo por tê-los conhecido. E abriu as nossas próprias perspectivas, com a nossa música a chegar a mais sítios do que as universidades nos Estados Unidos. A maioria das pessoas opta por fazer música depois de uma digressão, por isso há aqui uma grande diferença. Tivemos a oportunidade de trabalhar música por todo o mundo e depois distorcê-la, creio eu, durante o processo. Fico mais atento à música, aprendo ao trabalhar com outros músicos. Foi muito bom trabalhar com os alemães Notwist para variar das pessoas da minha vizinhança.

Como se processou esse trabalho? Enviavam uns aos outros pedaços de música através da internet?
Não foi tanto através da internet, mas através de discos rígidos e discos gravados. Trocámos música, na realidade. Creio que eles nos mandaram cinco temas e nós mandámos-lhes uns cinco ou seis. Trabalhámos assim na música uns dos outros e juntámo-nos na Alemanha, onde finalizámos tudo e onde inclusivamente, em estúdio, criámos mais alguns temas em conjunto.

Tendo falado dos 13+God, não podemos deixar de falar na Anticon, a editora. Vê-a como um daqueles casos em que o nome de uma empresa é por vezes mais importante e influente do que a música que propriamente edita? O que tem a Anticon que gera um fascínio especial em muita gente, uma vez que os discos não são todos iguais?
Tem havido uma tremenda confusão acerca da Anticon, especialmente porque as pessoas, particularmente a imprensa, olham para a editora como um colectivo de artistas. Quando os discos são editados, parecem não ser vistos como vindos de projectos diferentes, mas da Anticon. Não são os Why?, não é o Jel, não são os Themselves ou os 13+God. Muitas das vezes pensam que se trata apenas de mais um disco da Anticon, mas todos os diferentes grupos têm procurado desenvolver o seu som de modo a que tenham o seu próprio estatuto, o seu próprio nome.

Como vê esta abertura estética relacionada com a Anticon? É óbvio que se trata sobretudo de um universo hip hop, mas tanto os Why?, como o próprio Jel ou os 13+God, vêm mudando o seu som. Diria que estão a explorar novos territórios?
Estamos, de uma maneira de outra, a explorar novos territórios dentro de cada um de nós. Não temos uma intenção deliberada de fazê-lo assim, como no caso dos 13+God. Nunca pensámos “vamos fazer um disco com uma banda de rock de radio e torná-la acessível”. Trata-se, sobretudo, de uma procura individual de cada um de nós.

Passam agora três anos desde que editou o primeiro álbum assinado Jel. Quão diferente diria que é este “Soft Money” desse outro, “10 Seconds”, não apenas em termos de resultado final mas também da forma como abordou ambos os discos?
As coisas mudaram muito, decididamente. O que fiz em “10 Seconds” foi como que juntar aquilo que eram “Greenball” e “Greenball 2”, umas colecções de beats que tinha editado. O que tinha em mente para esse álbum não, ainda assim, completamente diferente daquilo que tinha em mente para “Soft Money” – transformar um conjunto de canções inteiras num álbum, num LP, e não apenas num conjunto de beats. Todas as canções de “Soft Money” são aquilo que queria. Queria que tudo fosse muito mais musical, que além da máquina de ritmos pudesse juntar guitarra, teclas, outras pessoas.

Como se dá esse processo de envolvimento de outros artistas da Anticon na música que faz?
Em “Soft Money”, trabalhei com algumas figuras nucleares da editora, como Why?, Doseone (seu companheiro nos Themselves), Pedestrian, Nosdam… Ouvi aquilo que andavam a fazer e achei que podiam envolver-se. Deixei-os escolher as canções, ao invés de levar uma em mente e pedir algo de específico. E em relação a pessoas como (Martin) Dosh e Andrew Broder, mandei-lhes umas quatro canções e eles decidiram tocar em 12, tendo eu depois que fazer uma selecção. Se fosse como eu realmente queria, as pessoas tocariam o que quisessem e eu depois cozinharia tudo em canções.

Sabe, certamente, que muitas pessoas utilizam o adjectivo “inteligente” para descrever alguma música feita sem instrumentos “reais” e fora do circo do rock’n’roll. Diria que é justo chamar a “Soft Money” um disco de hip hop inteligente?
Sim, inteligente é uma palavra que tem tido um entendimento estranho, alguns mal-entendidos… Esta música é mais inteligente do que muita daquela que é editada, no que ao conteúdo diz respeito, às palavras, ao conceito das canções. “Inteligente” é uma palavra muito abrangente, mas este disco é decididamente um disco mais concentrado. Não tem um conceito geral em que várias pessoas falam sobre sistema ou consciência social, não era minha intenção pregar o que quer que fosse. Não tento apenas abordar todo o materialismo ligado à música em geral, não é só isso que faço. Não é minha intenção chegar aos miúdos do liceu que querem esbanjar dinheiro em porcarias. Trata-se mais de estar atento ao que me envolve, aprender a distinguir o certo do errado, tirar partido disso.

Não apenas neste disco, mas ao longo do seu trajecto como produtor, trabalhou com diversas pessoas diferentes, de músicos a cantores. O que é que procura quando convida outras entidades para trabalhar consigo? O que procurava especificamente quando começou a trabalhar para o álbum “Soft Money”?
Quando escolho alguém, como as pessoas que escolhi para trabalhar em “Soft Money”, tenho como certo que toda a gente é capaz de fazer precisamente aquilo que idealizo. Mas quero apenas que toquem juntamente com a música. É uma vantagem conhecer todas estas pessoas e a sua música, pois faz-me sentir confiante acerca dos resultados.

Num comunicado de imprensa a respeito de “Soft Money”, é descrito como “the head architect of Anticon’s aural acropolis”. Como o faz sentir este retrato?
(Risos) Foi o Pedestrian (outro dos artistas ligados à Anticon) quem escreveu essa biografia. Não deixa de ser engraçado ter alguém dentro de casa a escrever a nossa própria biografia, seja Why?, Doseone, Pedestrian… Eles escrevem coisas que me fazem rir, mas transmitir isso aos outros é uma coisa completamente diferente. É algo que não se pede à mãe para escrever, mas ele escreveu-o e ficou assim…

Ele pode exagerar à vontade…
Mas as pessoas agarram-se a isso. E, de alguma forma, sinto alguma relação com esse retrato. Sobretudo, quando isso foi escrito, o que se passava é que eu era o produtor mais bem estabelecido de todos nós, fazia imensas colaborações…

Depois de “Soft Money” ser editado, o que se segue no futuro próximo artístico de Jeffrey Logan?
Há muitas coisas a acontecer. Estou agora a misturar o novo álbum álbum dos Subtle, para sair no Verão, estou a trabalhar com Mike Patton nos Peeping Tom e entretanto tenho estado com o Doseone a fazer algumas programações e gravações de voz para um álbum nosso.

E sobre os 13+God? Vai haver mais discos?
Sim, temos isso em mente. Provavelmente, no final do ano começamos a pensar nisso e eles virão até São Francisco. Como da ultima vez fomos nós lá, pensei em tê-los em São Francisco para o segundo álbum.

Texto: Pedro Gonçalves

CRÍTICAS

Beastie Boys

Beastie Boys
Solid Gold Hits (Capitol/EMI)
Sendo este um “best of” sucinto quando comparado com o duplo e ambicioso “The Sound of Science”, esta compilação dos Beastie Boys acrescenta-lhes à discografia aquele disco que por vezes é desejado ouvir quando se quer ouvir o que é mais familiar. Por outras palavras, este é de facto o disco dos “hits”.
Poderia incomodar, o que perfeitamente se compreenderia, a teor vagamente aleatório da ordem escolhida para o alinhamento, mas a verdade é que os temas todos parecem fluir sem atritos desde “So What’cha Want” a “Fight for Your Right”, respectivamente a abertura e o fecho da emissão do trio nova-iorquino. Talvez seja pouco interessante recordar, nesta altura, a relevância do grupo na História do rap e do hip hop nos Estados Unidos, que se prolonga para lá do facto de se traterem de três “caras pálidas”.
Só quando se pensa verdadeiramente em coisas que ficaram de fora, como o pouco propalado e altamente recomendável álbum instrumental “The In Sound From The Way Out!”, já a caminho dos 10 anos de idade, é que se retira um outro ponto ao somatório de 15 temas (“Body Movin’” na versão remisturada por Fatbot Slim) que, em épocas e contextos totalmente distintos, assumiram indiscutível relevância eventualmente explicada pela Sociologia.
(8) PG

Graham Coxon

Graham Coxon
Love Travels at Illegal Speeds (Parlophone/EMI)
Os Blur foram, queira-se ou não, uma das mais importantes bandas dos últimos 15 anos da música de produção britânica. Embarcados à força na cena então denomidada britpop, foram muito mais longe do que isso. Desistiram, em boa hora, de guerras sociais estéreis. Os Blur tinham no seu guitarrísta e principal pensador musical um músico absolutamente excepcional. Simplesmente, a dada altura fez todo o sentido que lhe começasse a faltar espaço para o que desejava fazer. Que começou por ser, diga-se, uma bizarra reanimação de um certo imaginário Syd Barrett.
Nesta altura já perfeitamente habituado às edições em nove indivivual, Graham Coxon trata de fazer deste Love Travels at Illegal Speeds um perfeito retrato de uma convivência quase impossível entre uma perfeita noção de contemporaneidade exterior e a capacidade de auto-concentração. Por isso, Love Travel at Illegal Sounds tanto pode cair nas graças dos que redescobriram o rock na última meia-dúzia de anos como daqueles que cresceram a saborear uns quantos cantautores da música feita ao longo da História do Reino Unido. Mas também há Ramones e Brian Wilson. Sortido finíssimo de canções.
(9) PG

01 março 2006

Iniciativa popular

Dave Matthews

Andando aqui numa pesquisa sobre certo e determinado assunto, dou com um maravilhoso pedaço de informação, daqueles que de quando em vez aparecem e alegram toda uma casa. Está online uma petição para trazer ao Rock in Rio Lisboa 2006 a Dave Matthews Band. Que, segundo se anunciava quando da minha casual passagem, ia com 2430 assinaturas.

A iniciativa popular é coisa de enaltecer. Estes pequenos movimentos que, de forma pacífica e ingenuamente inútil, pretendem agir sobre o imenso colectivo que os rodeia com generosidade merecem habitualmente uma recompensa.

Pois que venha ela, por exemplo, na forma de música, ou de cerveja fraca e gelada, ou ainda de contas poupança-habitação. Não há necessidade é de tirar Dave Matthews lá do país onde actua 537 vezes por ano para uma deslocação passageira a Lisboa.

É uma canseira, não vos meteis em tal empreitada. Além do mais, e acho que era aqui que queria na realidade chegar, Dave Matthews é chato como a potassa, inofensivo, incolor e inodoro.

Mas isto pode ser do meu ouvido, que é 1 pouco mouco.

Coisa mai' linda...

Tchi! Cinco dígitos no manhoso contador de visitas deste abrigo (está por aí â direita, para quem nunca viu).

Obridadinho. A sério. Obrigadinho pela condescendência*.

Mas isto pode ser do meu ouvido, que é 1 pouco mouco.

*Expessão assumidamente usurpada a J.P. Simões num momento particularmente hilariante num concerto dos Belle Chase Hotel na Aula Magna.

Carnaval

Já passou o Carnaval, não passou? Já é possível ter uma vida normal, não é? Obrigadinho.

Mas isto pode ser do meu ouvido, que é 1 pouco mouco.