04 outubro 2005

I'm bored, Mr Henriques. What's next?

Sean Paul

Para muitos apreciadores da música jamaicana, a forma corrente do género conhecido como dancehall é uma espécie de ovelha negra num rebanho resplandescente de tanta outra coisa nova com origem semelhante. Na realidade, é mesmo. É o lado pornográfico de uma moeda com milhentas faces. E aí é que está: nada a opor à existência de um lado, digamos, mais pornográfico.

Naturalmente, gente como Sir Coxsone Dodd dá hoje voltas no túmulo quando se compara este dancehall com aquele que viu nascer décadas antes. Mas o mesmo acontece com o R&B, por exemplo, aquela coisa vagamente pegajosa que aproveitou a designação de um género que em pouco se lhe assemelhava. Adiante.

Eu gosto de Sean Paul. Aliás, o seu segundo álbum, "Dutty Rock", consumiu-me horas de cavidade auditiva. Sean Paul é o jamaicano que hoje faz sonhar milhares de outros jamaicanos. Os Estados Unidos ildolatram-no, a Europa também já o conhece bem, o Japão não conta porque gosta de tudo. E Sean Paul sabe como fazê-lo, usando o "american way" de exibir-se, mostrando as raízes numa ou noutra entrevista, como a que em tempos tive o prazer de fazer-lhe.

Só que Sean Paul, dono daquela deliciosa voz nasalada capaz das melodias mais irresistíveis mesmo que ao vivo seja quase tão perceptível quanto uma formiga numa carruagem de metro de Tóquio, leva no novíssimo "The Trinity" o seu conceito até ao limite. Depois de "The Trinity", cujo título não deixa de fazer pensar que aqui pode acabar uma trilogia ("Stage One" / "Dutty Rock" / "The Trinity"), Sean Paul arrisca seriamente a não ter para onde ir.

O problema de "The Trinity" resume-se facilmente: é um disco muito mais plano do que "Dutty Rock", aparentemente mais próximo do que o "metrossexual" de cartilha street Pharrell Williams costuma fazer a quem com ele se mete. Sobra-lhe produção, não se duvide, faltando-lhe depois uma alma vendida ao Diabo, como parecia haver antes. De outra forma, dir-se-ia que Sean Paul se arrisca em "The Trinity" ao mesmo que aconteceu a Johnny Knoxville na transição de "Jackass" para Hollywood via "The Dukes of Hazzard". A velha teoria de dar às pessoas o que elas querem?

Tive o prazer de ouvir "The Trinity" antes de ele ser editado, por coincindência no meu dia de anos, e deste então tenho voltado frequentemente a ele. Porque Sean Paul continua a agradar-me sobremaneira. Não tendo virado completamente os ponteiros à bússola, agrada-me, claro. Mas houve tempos em que cheguei a pensar haver neste cidadão qualquer coisa de musicalmente especial. Ter-me-ei enganado, possivelmente.

Mas isto pode ser do meu ouvido, que é 1 pouco mouco.

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