03 novembro 2005
Loooooooooooooooongos dias finais
"Forget about who Kurt Cobain was, and about his legend, this movie is not about him. Forget about the critics and the Cannes Film Festival, it's not about them either. Last Days is a sincere and personal movie by people who apparently respect Kurt's memory. At least enough to tell a touching and aesthetic story inspired by his ordeal".
Fora o fenómeno dos blogs, não se perde muito tempo na Internet, a ler prosas de anónimos/desconhecidos/curiosos que têm ou julgam ter alguma coisa para dizer. É pena. O excerto acima citado é o de um tal "samertabri" registado como francês no Internet Movie Database. Ora, ou estarei a passar ao lado de um famoso opinador ou esta entidade não quer ser ninguém em especial, apenas partilhar uma opinião. O pedaço de uma prosa maior, manifestação escrita dos aplausos em pé, refere-se a "Last Days", obra mais recente de Gus Van Sant, o de "Drugstore Cowboy", o de "Psycho", o de "Elephant". E acerta em cheio no olho do boi. Mas há mais coisas a dizer.
Os Nirvana foram uma forma de ser num contexto perfeito. A sua forma de ser, materializada na sua música, fez apenas metade daquilo que ainda hoje é o fenómeno Nirvana. A outra parte, como está bom de ver, é mesmo o contexto, a enfabulação social de um movimento com fundamentos honrosos e profundos que em muitos casos se esfumaram certamente em overdoses de heroína. O grunge, Seattle, o desnorte adolescente. Juntos, estes elementos fizeram com que uma banda tão boa como muitas outras conhecidas pelo homem se transformasse no fenómeno Nirvana. E que, por arrasto, Kurt Cobain, o mistério torturado que liderava o combo, se transformasse ele próprio num monstro santificado de dimensões superiores às que conseguia suportar.
Em "Last Days", Gus Van Sant pega naquilo que os elementos conhecidos e a sua imaginação lhe proporcionam e, só o referindo nos créditos do filme, cozinha aquilo que lhe parece bem terem sido os dias finais de Kurt Cobain, nas botas de um tal Blake de uma qualquer banda que não é referida, e por consequência dos Nirvana. Às tantas, pensar-se-ia ter Gus Van Sant nas mãos as mesmas armas afiadas com que Oliver Stone fez "The Doors" e com que Taylor Hackford fez "Ray". E tinha. Só que Van Sant é, digamos, um "artista". E encaixa-se, neste âmbito, no denominado cinema de autor como um Ingmar Bergman em drogas estranhas.
Vai daí, em "Last Days" o tal Kurt Cobain-que-não-é-Kurt Cobain (Michael Pitt) tem tanto carisma quanto cada calhau de que é feita a casa onde habita na decadência. Michael Pitt, diga-se, é apenas um drogado em estado terminal cuja densidade dramática da personagem se esbate em longos planos dopados e no visto e revisto jogo dos anéis entrelaçados em que uma história (que história?) é contada em excertos que se intersectam. Naturalmente, Michael Pitt não é Val Kilmer em "The Doors" nem Jamie Foxx em "Ray". É assim uma coisinha que para ali anda com um cabelo e umas roupas que de facto lembram Kurt Cobain. O protagonista é, como facilmente se conclui, Gus Van Sant.
E Gus Van Sant é, como referido, um "artista". Por exemplo: em "Last Days" está presente a família Sonic Youth, Thurston Moore como consultor musical e Kim Gordon como fogaz personagem do filme. E, tal como os Sonic Youth, Gus van Sant é capaz de, mesmo muito lentamente, elevar os sentidos até ao ponto da ansiedade em picos pontuais de uma obra. E, tal como os Sonic Youth, também alguns desses picos, que podiam ser arrebatadores, se desfazem com um sopro de experimentalismo onanista. É isso, precisamente, que acontece em "Last Days".
Mas isto pode ser do meu ouvido, que é 1 pouco mouco.
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